Baixa execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional pode levar Portugal a devolver verbas a Bruxelas

PÚBLICO

11 Maio 2010 (3ª Feira)

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Baixa execução do Quadro de Referência Estratégico Nacional pode levar Portugal a devolver verbas a Bruxelas

Lições da gestão do QREN

Francisco Jaime Quesado


O Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) continua com uma execução muito baixa. Por força da regra N+3, se no final do ano a execução não aumentar de forma significativa, Portugal corre o risco de devolver verbas significativas a Bruxelas. No contexto desta baixa execução, e no meio de uma profunda crise financeira internacional, continua a ser evidente no nosso país a falta de um modelo de desenvolvimento que seja partilhado sob a forma de contrato estratégico entre o Estado e a sociedade civil. Os actores económicos e sociais (municípios, empresas, universidades, centros de inovação) preocupam-se unicamente com a sua sobrevivência conjuntural e com isso desperdiçam a oportunidade única de fazer do QREN uma aposta sustentada para o futuro do país.

O QREN foi concebido como um instrumento inovador para dar resposta às novas exigências que a competição da economia global e os novos fenómenos sociais exigem ao nosso país. O balanço de 20 anos de fundos comunitários em Portugal, recentemente cumpridos, é muito claro: aposta sustentada na melhoria das infra-estruturas do país, numa lógica não raras vezes pouco coordenada e monitorizada (veja-se a proliferação desnecessária de parques industriais e pavilhões desportivos municipais), falhas sucessivas nas acções de formação empreendidas ao longo das três intervenções levadas a efeito, resultados muito frágeis nas áreas essenciais da inovação, conhecimento e competitividade. Ou seja. Vinte anos depois, Portugal é um país de auto-estradas com menos coesão territorial e crescentes desigualdades sociais numa Europa em grande indefinição de identidade.

O QREN não pode ser interpretado pelos actores nacionais com mais um instrumento financeiro utilizável para dar cobertura a uma crescente falta de financiamento nos circuitos tradicionais. Em tempo de crise financeira, impõe-se mais do que nunca um verdadeiro “choque operacional” que conduza a mudanças claras e necessárias: desactivação das actividades empresariais sem valor, aposta maciça numa formação/educação que produza quadros reconhecidos pelo mercado, fixação de investimentos e talentos nas regiões mais desfavorecidas, criação de um contexto competitivo moderno voltado para a criatividade das pessoas e qualidade de vida das cidades. O QREN dispõe de instrumentos financeiros que poderão ajudar a alavancar toda esta agenda de mudança que queremos para o nosso país. Dois anos depois, são ainda muito tímidos os sinais da concretização desta mudança.

É por isso que a aposta numa “estratégia colectiva” para o futuro tem que ser a marca desta nova fase do QREN. Um sinal de aposta nas políticas do conhecimento, centradas em territórios inteligentes e apostas na dinamização de verdadeiros “trabalhadores criativos”. Ideias muito simples e claras e para as quais mais não é necessário do que um pacto de “cumplicidade estratégica” e “convergência operacional” entre todos os que têm responsabilidades – actores públicos, empresas, universidades e centros de saber. O QREN não pode ser interpretado como um mero instrumento conjuntural de resposta a uma crise estrutural mas antes como uma aposta estrutural capaz de alterar a conjuntura no futuro.

Portugal não pode correr o risco de devolver verbas do QREN a Bruxelas. Em tempo de profunda crise financeira, têm que ser accionados mecanismos de rápida absorção das verbas disponíveis. Mas não a qualquer preço. Sob pena de estar a hipotecar o futuro.

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